Preview: Towerborne é um sonífero disfarçado de beat ’em up
Testamos Towerborne no PC e nossas primeiras impressões não foram nada positivas
u amo beat 'em ups! Os adoro desde a sua explosão de popularidade nos anos 1990, quando éramos brindados por pérolas atemporais como os sublimes Streets of Rage 2, Final Fight e TMNT, até as suas mais recentes empreitadas, como o meu queridinho, o impecável River City Girls 2.
É exatamente por isso que não me traz qualquer alegria bater em Towerborne. Poucas coisas me fariam mais feliz do que sentar aqui e escrever sobre como o jogo poderia trazer ainda mais interesse e atenção a esse gênero maravilhoso, especialmente porque eu pude jogar online cooperativamente com a CEO da desenvolvedora Stoic, a fofa e gentil Trisha Stouffer, um anjo de pessoa. Essa é uma das poucas coisas tristes sobre trabalhar com críticas de videogames.
Ao mesmo tempo em que Trisha falava apaixonada e sinceramente sobre os elementos do gameplay, eu olhava para o meu relógio e torcia para que o teste chegasse ao fim o quanto antes, pois eu preferia voltar a trabalhar escrevendo e suando no calor a passar mais um minuto sequer jogando Towerborne, de tão pouco que gostei dele. Novamente, a ética profissional me obriga a ser sincero por aqui, ainda que não me traga qualquer alegria reclamar de em um projeto que claramente foi feito com muito amor e dedicação.
Towerborne repete os erros dos piores beat ’em ups
Vamos começar tirando de uma vez os principais problemas do caminho. Quem joga bastante beat ’em up já está careca de saber quais costumam ser os principais problemas do gênero e, infelizmente, ao menos na versão de Early Access que tivemos acesso, Towerborne tropeça em ambos.
Primeiro, e mais importante, não consegui sentir prazer algum em desferir golpes, já que todos eles pareceram muito leves e sem impacto, quase como se os heróis e os inimigos existissem em planos diferentes. O impacto falha sensorialmente em todos os fronts: no tato, ao não sentirmos o peso dos golpes, no visual, ao remeter um pouco a jogos feitos em flash, e na audição, já que nem os efeitos sonoros tornam os hits gratificantes. Faltam aqueles estalos, cliques e estouros que te deixam ligadão como nos grandes fliperamas de outrora.
O segundo pecado capital do beat ’em up também é cometido por Towerborne: simplesmente não há variedade o bastante de inimigos para encarar. Nas três fases que testamos, cada uma durando 10 minutos ou menos, você vai batendo em ondas e mais ondas de criaturas muito parecidas entre si, normalmente lagartos com diferentes níveis de armadura. A sensação de frescor não dura mais do que um ou dois minutos após começar a andar pelo nível, ainda que ao menos o design de ambientes seja um pouco mais interessante — mas não muito.
A apresentação geral também é simplória. Voltando a elogiar River City Girls, que considero uma franquia exemplar, lá temos ilustrações muito carismáticas das heroínas e vilões conversando entre as cenas, e atuações fora de série dos atores e atrizes que dublam os personagens com muita simpatia e talento. Em Towerborne não temos nada disso, apenas balõezinhos de texto saindo da boca dos personagens mudos, restando apenas a companhia de uma trilha sonora com orquestrações genéricas nada memoráveis.
Então o que presta em Towerborne?
Para não ficar apenas nas críticas, há alguns elementos que poderiam despertar relativo otimismo no futuro de Towerborne. Por exemplo, como normalmente rola no gênero, jogar com outras pessoas torna a experiência consideravelmente melhor, e o servidor deles merece elogios. Mesmo jogando com gente de outro hemisfério, não senti qualquer lag ou registros de comandos errados. O muito elogiado Streets of Rage 4, por exemplo, é terrível nesse departamento, então a Stoic merece elogios aqui.
Os elementos leves de RPG do Towerborne também foram bem aplicados. Ao completar uma fase, você e seus aliados ganham bastante loot como recompensa, e ele envolve desde armas melhoradas até armaduras com visuais e atributos variados. Como há 4 classes diferentes para escolher, upar o seu nível e construir builds pareceu profundo e instigante o suficiente. É curioso, mas as recompensas das fases trazem mais alegria que o processo de desbravá-las.
Testei três das classes e, embora elas não mudem drasticamente o gameplay e nem nada assim, ao menos os seus golpes e especiais diferenciados eram convidativos para a experimentação. Uma classe era mais padrão, com espada e escudo, outra usava e arremessava uma espécie de adaga, e outra tinha uma espécie de cetro explosivo, que foi a que menos usei, mas pareceu mais divertida.
O criador de personagens, por sua vez, me deixou meio dividido. Há certamente uma boa quantidade de rostos, olhos, cores e traços específicos para você criar um bonequinho meio ao estilo Studio Ghibli, uma influência declarada da Stoic no desenvolvimento, mas sinto que o jogo ficou meio perdido entre o discurso e a prática auto-intitulada de “progressista” por alguns.
Por exemplo, a primeira opção de customização que vemos, de cara, é a do Body Type (ou “tipo de corpo”, em tradução livre), tática comum que vem sendo empregada cada vez mais para não limitar o jogador a se definir como homem ou mulher. Mas é um tanto contraditório que, apesar da tentativa de evitar um sistema binário, as suas únicas duas opções ali sejam uma silhueta masculina vestindo uma cueca, ou outra silhueta feminilizada vestindo calcinha e sutiã. O que exatamente o jogo quer dizer com isso? Sinto que tanto as vozes mais conservadoras como as progressistas vão se incomodar com isso por diferentes motivos.
Na prática, uma preocupação bem mais real e urgente é que eu cheguei ao editor de imagens disposto a criar uma waifuzinha legal, como normalmente gosto de fazer em todos os jogos, mas como os formatos de rosto e tipos de olhos ficavam todos bem misturados entre si, ao puro acaso acabei gerando um personagem meio parecido com o Cascão da Turma da Mônica. Quando notei a similaridade, mudei de ideia e passei a me dedicar a fazer um Cascão mesmo, e o resultado até que ficou engraçadinho:
Ou seja, acho que com um pouco mais de polidez, clareza e foco nos menus, talvez na versão final a gente consiga ter um editor de personagens competente? Por enquanto, no entanto, esse não é o caso de Towerborne, que ainda precisa dar uma geral na UI e filtro de opções do seu criador. Aqui, pelo menos, eu vejo potencial após um ajuste fino.
Vale a pena jogar Towerborne?
Como imagino que o texto tenha transparecido, no Early Access a minha resposta seria um inconteste “não”. Até que a Stoic consiga tornar o processo de andar e bater mais divertido, não há qualquer motivo para usar o seu tempo com Towerborne. No computador, há inúmeras opções em promoção para você comprar agora mesmo.
E antes que algum leitor mais ouriçado cogite a hipótese de que possa haver implicância por se tratar de um jogo mais associado à marca Xbox, eu deixo aqui uma dica de ouro: se você tem e joga no console da Microsoft, dê uma chance ao moderno Battletoads. Considero um jogo extremamente subestimado, que inclui um estilo de arte ousado e fases desafiadoras, honrando bem o legado do clássico de nintendinho.
Fato é que os beat ’em ups mereciam um representante melhor que Towerborne. E, felizmente, vivemos em uma geração onde existem opções melhores aos montes.
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