Com Lego Fortnite, Epic Games quer levar IP para além do battle royale
Em entrevista, executivos da Epic Games e da Lego revelam segredos da parceria que deu origem a Lego Fortnite
esde o último sábado (2), a Epic Games está engajada em hypar o público a respeito dos novos modos de jogo que, agora, aterrissam na franquia e dividem espaço com o megapopular battle royale: Fortnite Festival, Rocket Racing e, claro, Lego Fortnite.
Como não poderia deixar de ser, esse último game se tornou destaque não apenas no preview disponibilizado aos jogadores durante o evento Big Bang de Fortnite, mas também nas divulgações feitas ao longo da semana, incluindo um trailer cinemático que dá o tom da aventura e a liberação completa da jogatina nesta quinta (7).
Antes de tudo isso, no entanto, a equipe do Flow Games deu um pulinho em Nova York para experimentar o título em primeira mão e, de quebra, bater um papo com executivos da Epic e da Lego para descobrir os segredos por trás dessa collab épica e tirar uma casquinha do que essa parceria pode render daqui a algum tempo.
Por isso, enquanto você espera baixar o conteúdo de Lego Fortnite no seu PC, confira nossa entrevista completíssima sobre o game.
Lego Fortnite
A conversa que tivemos com Nate Nanzer, vice-presidente de parcerias globais da Epic Games, e Remi Marcelli, vice-presidente sênior de games e metaverso da Lego, foi interessante por diversos motivos.
Primeiro, porque ela marcou uma reaproximação da Epic com a imprensa mundial. Apesar dos eventos épicos realizados dentro de Fortnite, a empresa não fazia encontros físicos massivos para a divulgação de seus jogos há mais de uma década, desde quando desenvolvia a série Gears of War.
Isso, é claro, leva ao segundo ponto: fica claro que Lego Fortnite e as outras experiências que chegam a Fortnite são importantes tanto para a companhia quanto para o futuro da franquia, valendo esse esforço extra para que sua palavra chegue a novos públicos.
Por fim, a coletiva de imprensa que contou com a participação do time do Flow Games trouxe muitas informações de bastidores e alguns detalhes que não estão na postagem feita hoje pela manhã no blog oficial de Fortnite. Um exemplo? O fato de a Lego ter se afastado ativamente do battle royale até que ele estivesse pronto para recebê-la.
Na sequência, você pode conferir os destaques do bate-papo e conhecer mais a fundo essa e outras histórias de Lego Fortnite. Boa leitura!
- Nota: a entrevista a seguir foi editada para trazer mais clareza e concisão ao texto, sem alterar as falas dos entrevistados.
Lego e Fortnite: uma parceria inevitável (mas que quase não aconteceu)
Dá para dizer com muita segurança que Lego e Fortnite são duas marcas que esbanjam uma batelada de similaridades: ambas exploram a criatividade dos usuários, permitem criar e desmanchar coisas, são verdadeiros fenômenos mundiais e, é claro, chamam atenção principalmente de um público jovem e dedicado.
Por um tempo, no entanto, o pessoal da fabricante de brinquedos viu mais diferenças do que semelhanças entre as IPs, incluindo uma que impedia quase que completamente uma possibilidade de parceria com a Epic Games.
“O Grupo Lego acompanha Fortnite há muito tempo, porque sempre gostamos de trabalhar com pessoas que influenciam a cultura e Fortnite já faz isso há um bom tempo. Mas o título principal deles [o battle royale] não era apropriado para crianças, então decidimos não fazer parceria [anteriormente]”, conta Marcelli.
Essa perspectiva mudou quando a Epic Games não só começou a ampliar o portfólio de experiências, gêneros e tipos de jogo disponíveis dentro de Fortnite, mas também implementou e reforçou substancialmente sua oferta de recursos para controle parental e segurança dos jogadores-mirins.
“Nosso objetivo número um com Lego Fortnite é fazer um jogo incrivelmente divertido para crianças de todas as idades, mas há um monte de coisas realmente importantes nas quais temos trabalhado nos últimos meses para garantir que também seja algo seguro para as crianças”, explica Nanzer.
Nosso objetivo número um com Lego Fortnite é fazer um jogo incrivelmente divertido para crianças de todas as idades.
Entre os exemplos citados pelo executivo da Epic Games estão opções para os pais aprovarem pedido de amizade para seus filhos, delimitarem o quanto eles podem gastar por dia no jogo e, principalmente, definir que tipo de conteúdo eles podem acessar in-game – algo que só faz sentido com o recém implementado sistema de classificação etária de Fortnite.
“[Por isso] sentimos que era um bom momento para começarmos a trabalhar juntos na criação de algo que não fosse uma ‘versão Lego do battle royale’ ou um ‘battle royale com peças de Lego”. Mas sabíamos que, física ou digitalmente, iríamos inventar algo juntos e era o momento certo para fazê-lo”, comenta o VP da Lego.
Indo além do battle royale com Lego Fortnite
Ter garantido essa parceria pode ter sido essencial para que a Epic consiga colocar em prática o que parece ser sua estratégia para Fortnite daqui em diante: expandir os horizontes do jogo, conquistar um público que ainda não foi impactado pela marca e mostrar que é muito mais do que um battle royale.
“Claro que o battle royale ainda vai muito bem. Chegamos à marca de 100 milhões de usuários ativos mensais em novembro, então ainda há muito interesse no jogo. Mas sabe de uma coisa? Nem todo mundo no mundo gosta de jogos no estilo battle royale”, admite o chefão de parcerias da publisher.
“Existem muitos tipos diferentes de jogadores, então ter experiências diversas, como um título de sobrevivência ou até mesmo o modo de construção livre do Lego Fortnite, é algo realmente incrível. Adicione um jogo de corrida e outro de música ao pacote e você realmente começa a ter algo para cada tipo de gamer dentro do Fortnite”, dispara.
Nanzer conta ainda que a Epic tem trabalhado duro ao longo dos anos para expandir a definição do que Fortnite significa – para além do battle royale. O lançamento do Modo Criativo e a chegada da Unreal Engine for Fortnite (UEFN), em março deste ano, são citados como peças importantes para fazer com que isso aconteça.
“No final das contas, a escala dessa busca por uma maior diversidade de experiências virá, na verdade, dos criadores: hoje, eles já estão construindo mais de 60 mil jogos e projetos diferentes na UEFN”, avalia o executivo.
A escala dessa busca por uma maior diversidade de experiências virá, na verdade, dos criadores.
“Dito isto, não há literalmente nenhuma marca melhor no mundo do que a Lego para se construir algo incrível e que as crianças vão adorar, mas que também é um jogo no qual você verá muitos pais brincando com seus filhos. É bem empolgante expandir os tipos de jogabilidade disponíveis para o público desta forma”, completa.
Via de mão dupla
Para Remi Marcelli, se aproximar de uma empresa como a Epic também era uma forma do Lego Group se forçar a ser mais criativo e inovar em seu sistema de construção. “Se você experimentar um pouco o jogo, perceberá que a junção de peças de Lego + física adiciona uma dimensão que não temos tão facilmente no mundo real. É algo que não conseguiríamos fazer sozinhos e que é realmente único a Fortnite”, analisa.
“Acho que a fidelidade visual, a física – como Remi mencionou – e a geração procedural do mundo são o que realmente fazem a diferença em Lego Fortnite”, comenta Nanzer, citando ainda um quarto motivo para que o game não apenas contribua para o legado da marca de brinquedos, como também se destaque diante de concorrente.
“Sou suspeito para falar, mas não acho que ninguém gerencie jogos como serviço melhor do que a Epic com o battle royale de Fortnite”, afirma o executivo. “Estamos aplicando tudo que sabemos sobre isso ao gênero de sobrevivência”.
Isso não significa que a dona da Unreal Engine não tenha que ter aprendido um bocado com a collab, principalmente para garantir que a turma que os fãs de Lego se sintam bem-vindos dentro da nova jogatina. Lego Fortnite, por exemplo, parece seguir uma cartilha de regrinhas semelhante ao que vimos no filme animado “Uma Aventura Lego”, em que tudo é feito dos bloquinhos e a interação entre as pessoas ecoa o que vemos na vida real.
Será que fazer algo assim no ambiente digital foi muito trabalhoso? Respondendo ao Flow Games, o VP da Epic Games foi sincero: “acho que a equipe que construiu isso diria que é muito estressante [risos], porque os fãs de Lego são muito apaixonados pela marca”. Assim, a expectativa dessa audiência foi algo que norteou muitas das decisões da equipe de desenvolvimento.
“Essa turma terá expectativas sobre a aparência dos tijolos, expectativas sobre como eles soam, como é a sensação quando eles se encaixam, o barulho que fazem quando estruturas são desfeitas e tudo mais. Todas essas expectativas estão aí”, diz Nanzer. “Mas quer saber algo interessante? O primeiro fluxo de trabalho na parceria entre Epic e Lego foi pegar cada peça de Lego que já existiu e trazê-la para a Unreal Engine 5”.
Com isso, o estúdio conseguiu criar o alicerce para construir tanto Lego Fortnite quanto para viabilizar outros jogos e experiências Lego diferentes no futuro, como versões digitais de Ninjago ou Lego Dreamzzz. “Acho que a equipe da Epic fez um trabalho incrível em dar vida à magia do sistema Lego dentro do jogo”, celebra o executivo.
Gaste se puder ou jogue tudo de graça
Como não poderia deixar de ser, parte do papo com os chefões de Lego e da Epic Games giraram em torno de como o novo jogo será monetizado para render dividendos para ambas as empresas e ajudar a financiar outros projetos no ecossistema. Venda de skins? Comercialização de kits de Lego?
“Essas são duas coisas [que podemos fazer em relação à monetização], com certeza. Quero dizer, a maior parte do nosso negócio em Fortnite gira em torno da venda de roupas e personagens”, comenta Nanzer, dizendo estar bem entusiasmado com a transferência gratuita de skins de Fortnite para o estilo ‘miniatura’ de Lego.
“Apesar disso, prevemos que muitas pessoas que só vão chegar agora ao jogo e elas terão uma porção de minis disponíveis para compra. A boa notícia é que se elas acabarem jogando outras experiências que usam o modelo de personagem battle royale – mesmo que você tenha comprado a versão Lego primeiro – você também terá o visual convencional”, destrincha.
Muitas pessoas que só vão chegar agora ao jogo e elas terão uma porção de minis disponíveis para compra.
Em relação a sets de Lego, o executivo comenta que devemos ver algo como plantas digitais para construções específicas sendo vendidas futuramente. “O portfólio da franquia Lego é tão profundo e rico que estamos apenas arranhando levemente a superfície do que é possível fazer com ele”, avalia.
“Ao mesmo tempo, achamos que jogar de graça é muito importante. Não deveria haver ninguém que queira jogar este jogo com seus amigos e que não possa fazê-lo porque não pode pagar US$ 70 ou qualquer outra coisa para ingressar. Não prevejo que algum dia mudaremos esse modelo de monetização e acesso no ecossistema Fortnite”, acrescenta o VP da Epic Games.
E um passe de temporada ou de batalha, também faz parte dos planos para Lego Fortnite? Segundo Nanzer, nada do tipo estará disponível no período de lançamento do jogo, mas é algo que está sim no horizonte futuro da aventura sandbox, após a empresa trazer mais pessoas para dentro do game e obter seu feedback sobre ele.
“No final das contas, quando lançamos o próprio battle royale não havia nenhum sistema de monetização. Então, o foco não tem sido muito discutir quais são as 500 ideias diferentes de monetização que podemos ter, mas sim em criar uma ótima experiência para o jogador – e acho que isso irá evoluir com o tempo”, define.
O foco não tem sido muito discutir quais são as 500 ideias diferentes de monetização que podemos ter, mas sim em criar uma ótima experiência para o jogador.
Mais opções para criadores
Todo esse investimento em criar novas experiências dentro de Fortnite, capitaneado pelo lançamento da jogatina de sobrevivência com a marca Lego, pare reforçar uma mudança de paradigma dentro da Epic Games.
Dona de um dos motores gráficos mais populares e flexíveis do mercado, a empresa parece estar migrando da mensagem “você pode fazer qualquer coisa com a Unreal Engine” para algo como “você pode criar o que quiser dentro de Fortnite”. Será que essas duas visões não acabam entrando em conflito?
“Não, acho que são altamente complementares. Mais de 50% dos jogos de console atuais são feitos com Unreal Engine”, informa o VP de parcerias da companhia. “Então, para fazer jogos AAA, a UE é uma ótima escolha. Ao mesmo tempo, você pode ter uma equipe de duas pessoas trabalhando na UEFN, construindo um jogo em quatro dias e disponibilizando ele no Fortnite”.
Apesar de não fazer parte da Epic, o executivo da Lego também deu seu pitaco sobre o assunto a partir de uma perspectiva muito interessante. “Como cliente, usoo a Unreal Engine para criar conteúdo, por exemplo, para Lego Dreamzzz e Ninjago, para gerar imagens fotorrealistas para embalagens, para peças de publicidade e muito mais – isso é uma parte do negócio”, conta Marcelli.
“Por outro lado, também estou usando a Unreal Engine for Fortnite para criar jogos Lego que serão lançados depois que Lego Fortnite encontrar seu público. Então, se você tem um estúdio com 200 pessoas, talvez precise da UE5. Mas se você tem 5 amigos, é possível fazer isso com a UEFN, ao passo que jogadores de 10 anos podem realizar algo no Modo Criativo sem problemas”, finaliza.
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Lego Fortnite foi lançado em 7 de dezembro de 2023 e está disponível para PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series X/S, Nintendo Switch, PC e dispositivos Android. O jogo também pode ser transmitido pela nuvem, em serviços como Xbox Cloud Gaming, Nvidia GeForce Now e Amazon Luna.
*O Flow Games viajou a Nova York a convite da Epic Games.
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